terça-feira, 26 de maio de 2009

Carinho ao longe


Data: 26 de maio de 2009.
Nestes dias de saudades imensas, o carinho on line acalenta o coração!
Já nem me lembrava que o famoso "O Pequeno Príncipe" se passava aqui na África...
Ah, os baobás... Obrigada, querida Piva!

"Olhem atentamente esta paisagem para que estejam certos de reconhecê-la, se viajarem um dia na Africa, através do deserto. E se acontecer de passarem por ali, eu lhes suplico que não tenham pressa e que esperem um pouco bem debaixo da estrela! Se então um menino vem encontro de vocês, se ele ri, se tem cabelos de ouro, se não responde quando interrogam, adivinharão quem é. Então, por favor, não me deixem tão triste: escrevam-me depressa que ele voltou..." (Antoine de Saint-Exupéry)

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terça-feira, 12 de maio de 2009

Albina e Negra



Ontem estava pensando em escrever algo das coisas bonitas daqui... Das pessoas, das paisagens...
Não fiz exatamente uma “revisão” do que eu já contei, mas de qualquer modo tenho receio de estar passando apenas imagens ruins! Sim, os problemas são muitos, mas se fosse só isso a experiência seria insuportável...
Seja como for, a idéia de escrever algo “de bom”, caiu por terra hoje na hora do almoço! Estava com a cozinha alagada devido a um cano que estourou, então fui comer fora.
No caminho, os artesãos oferecendo seus lindos trabalhos, os chapas lotados da rua, os varais improvisados com dezenas de coloridos batiques (telas de pintura local), a rua se remexendo em cor com as mulheres vestidas em suas capulanas (tecido local). Tudo de uma simplicidade e beleza já cotidiana. Eis que na porta do lugar onde eu ia comer uma mulher sentada no chão pedindo esmolas.
Nada de diferente se aquela mulher não fosse albina. Não, isso também não seria tanta novidade. O que me chocou, o que me impactou, foi que a mulher não tinha olhos! No lugar de seus olhos, duas pequenas manchas vermelho vivo, vermelho sangue. Era mendiga, albina, cega e não tinha os olhos! A cena mais impactante nestes meses.
Aqui as pessoas geneticamente com ausência de melanina na pele e cabelo (albinas) são muitas! E o preconceito muito grande! Sim, penso que o preconceito com os albinos é grande em qualquer país hoje em dia. Mas isso, em um país onde quase todos são negros, é “outra coisa”! Você não é apenas visivelmente diferente, você é o “contrário”! Enquanto todo o país e toda a sua família têm uma concentração muito grande de melanina na pele (e por isso que são chamados negros), a melanina não existe pra você! Quando você tem avós, pais, tios e irmãos negros, logo, também é negro. Mas negro? Como ser negro e albino ao mesmo tempo?
Tamanha é a dificuldade que em muitos lugares da áfrica subsaariana os albinos são visto como portadores de poderes mágicos e, por isso, são mortos e as partes de seus corpos vendidas e aproveitadas como remédios ou amuletos para trazer riquezas! Aqui não soube nada oficial, embora tenha ouvido que os assassinatos também acontecem! Já Tanzânia (que faz fronteira com Moçambique) esses assassinatos são freqüentes e são noticiados.
Não morta, a mulher que vi não tinha olhos! Tinha dois buracos com sangue vivo no lugar dos olhos! Com certeza não pode e não soube como manter seus olhos. Ela tinha, sim, feridas na pele, devido à exposição ao sol. Não estava coberta para proteger sua pele frágil. Certamente também não tinha passado cremes com protetor solar para abrandar essa exposição!
Só sei que essa imagem grudou na minha cabeça: Ela, negra, albina, na África, na rua, sentada no chão, ao sol das 13h, sem olhos, estendia a mão a quem passava, a pedir esmolas...
Desta vez, não tenho nada “ameno” para contar. Apenas divido com vocês essa imagem/ inquietação!
(A "poesia" deixo para a imagem que ilustra esse relato: Neste momento, vocês podem voltar os olhos para a mulher carregando o seu bebê na capulana, e sorrir!)
Fonte da imagem:
www.flickr.com/photos/feijeriemersma/3376083070/
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A captura do constrangimento


Data: 12 de maio de 2009.
Provavelmente sabia que era ele o motivo da fotografia.
Todos puderam olhar para a câmera.
Ele não conseguiu.
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domingo, 3 de maio de 2009

Notícias Africanas 04



Depois de terminar o "relatório", vi que a coisa estava na “associação livre”... Deixo assim mesmo!!

Hoje vou contar um pouco sobre Maputo e Nelspruit! Isso porque na sexta-feira de tardezinha uma colega ligou e disse: “-Vamos amanhã pra Nelspuit?”. E foi isso que aconteceu no sábado!

Embora Nelspruit (África do Sul) tenha 222 mil habitantes, ela é uma cidade de referência para Maputo (para saúde, consumo/compras e tecnologia), mesmo que Maputo (Moçambique) tenha mais de Um milhão de habitantes. A cidade sul-africana tem ares ingleses (ao menos na minha imaginação): tudo muito bem cuidado, ruas largas, bem sinalizadas, nenhum lixo na rua, nenhum morador de rua também! Contrasta com Maputo onde a maioria das ruas é estreita, muito esburacada e há pouca sinalização; O lixo em Maputo é um dos maiores problemas, está todo espalhado pelas vias nas áreas mais nobres e não possui coleta nos bairros mais afastados. A capital também não tem aterro sanitário! Não é raro que uma das sacolas plásticas que “voam pelo céu da cidade” acabe grudada no vidro de um carro e atrapalhe a direção!

(Ah, e por falar em direção, aqui o volante do carro fica do lado direito! Os carros são muito baratos, vem do Japão e, assim, quase todos têm cambio automático! O sentido do tráfego também é ao contrário! Custou muito aprender para onde olhar quando eu queria atravessar a rua! Eu costumo até fazer uma brincadeira “-Sabe o que é pior do que os carros andando em sentido contrário? Pior é não ter carro na rua e daí nem saber de que lado vem o perigo!” Na verdade nem é piada! Já aconteceu da rua estar totalmente vazia, eu não atravessar e esperar algum carro passar!! Assim eu sabia pra onde olhar durante o resto do percurso!!)

Voltando ao assunto anterior, passeio Nelspruit/Maputo, a estrada é muito bonita! Ela passa ao lado de uma imensa reserva (trecho de floresta protegida que junta Moçambique+Africa do Sul+Zimbabwe). Na altura onde fica o famoso “Parque Nacional do Kruger” é possível ver os animais da estrada! Ontem mesmo havia três jovens girafas, dois javalis e uma impala (um tipo de veado) bem pertinho da gente!! É assim: no Brasil olhamos da janela do carro e tem uma vaca. Aqui tem girafa, a 7 metros de você... Indescritível!!

Me contaram que antes a capital de Moçambique era a Cidade da Beira, mas como Maputo ficava mais próxima a África do Sul, fizeram a mudança! Ao menos é o que alguns moradores dizem... Tentei rapidamente agora achar algo na internet sobre isso, mas não tive muito sucesso! O que sei é que o norte do país é mais pobre que o sul. Moçambique tem várias etnias e 4 línguas locais "predominantes". Após a independência a língua portuguesa foi escolhida para tentar unificar o país. Segundo Mia Couto, em um programa de TV, embora o português seja a língua do colonizador a escolha por ela, e não por uma língua local, foi para que nenhuma etnia se sentisse mais valorizada que outra por ter sua língua posta como oficial no país. Mesmo assim, ao andar pela rua não é possível entender o que as pessoas falam! Menos de 30% da população do país fala português! As línguas locais têm um som totalmente estranho para os latinos. Estão classificadas como de origem bantu (mais de 600 línguas) e embora aqui existam entre 17 e 20 línguas, as mais importantes aqui são o xhosa, macua, xangana e zulu (não sei escrever direito).

Acho que a relação entre os dois países dos quais falo neste texto é muito parecido com a relação entre México e Estados Unidos. Embora não precise de visto para passar de um país a outro (o que é muito diferente dos países da América que citei), as pessoas saem de Moçambique em busca de uma vida melhor na África do Sul. Muitos vão trabalhar em minas de carvão, em condições subumanas e com o sonho de ganhar dinheiro e melhorar a vida da família. Desta forma sempre alguns ônibus com muitos trabalhadores são interceptados pela polícia! Por que as pessoas viajam sem nenhuma segurança, sem contrato de trabalho, em condições horríveis e quando chegam ao destino o trabalho que os espera é o trabalho em condições escravas! Igual também a migração do nordeste para o sul/sudeste do Brasil...

Tudo isso só me faz ter certeza que esse sistema de valores que vivemos é terrível... Na distribuição da riqueza... Nas mazelas de nossa gente de todo o mundo...

Bem... Não sei muito como terminar esse relato!! Só me vem na cabeça uma música sobre esse último tema... A música é romântica... Suave, como suave e romântica é a esperança dos trabalhadores do México, Brasil e Moçambique sobre a mudança de suas vidas...

“Veja você, arco-íris já mudou de cor
E uma rosa nunca mais desabrochou
E eu não quero ver você
Com esse gosto de sabão...na boca
Arco-íris já mudou de cor
E uma rosa nunca mais desabrochou
E eu não quero ver você
Eu não quero ver...
Veja meu bem, gasolina vai subir de preço
E eu não quero nunca mais seu endereço
Ou é o começo do fim...ou é o fim...
Eu vou partir, pra cidade garantida, proibida
Arranjar meio de vida, Margarida
Pra você gostar de mim

Essas feridas da vida Margarida
Essas feridas da vida, amarga vida
Pra você gostar... ”
(Vital Farias- Veja Margarida)

Para ouvir a música acima, tem um bom som (mas não tem imagens):